Header AD

Prova Digital na Justiça do Trabalho: O Erro do "Link Externo" que Você Não Pode Cometer



Vivemos na era da prova digital. Hoje, um vídeo de trinta segundos gravado por um celular pode valer mais do que três testemunhas em uma audiência de instrução. A imagem de um trabalhador manuseando produtos químicos sem proteção ou laborando de madrugada é contundente.
No entanto, a facilidade tecnológica trouxe uma "casca de banana" processual que tem derrubado muitos advogados experientes: a forma de juntada dessa prova aos autos.
Recentemente, analisei um caso real, tramitado no Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região, que serve como uma aula magna sobre o que não fazer ao apresentar provas de vídeo e áudio.
Trata-se de uma Reclamação Trabalhista envolvendo um trabalhador rural. 
O advogado obteve êxito em provar o vínculo de emprego, algo complexo no meio rural. Contudo, perdeu os pedidos de maior valor financeiro — insalubridade e horas extras — por um detalhe técnico: o uso de links externos (nuvem) na petição inicial.
Neste artigo, vamos dissecar esse caso  para extrair lições valiosas. Vamos entender por que o juiz se recusou a clicar no link do vídeo e como você pode blindar seus processos contra esse tipo de nulidade.

1. O Problema do "Link" na Petição Inicial

No caso analisado, o reclamante alegava que, além de operar máquinas, aplicava venenos agrícolas (agrotóxicos) utilizando um pulverizador costal, sem os devidos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).
Para provar essa alegação grave, o advogado inseriu na petição inicial um link de uma plataforma de armazenamento em nuvem (como Google Drive ou OneDrive), onde estariam os vídeos do obreiro trabalhando.
A lógica do advogado foi prática: o arquivo de vídeo era pesado demais para o sistema PJe, então ele facilitou o acesso através de um link.
Contudo, a sentença foi implacável. O magistrado de primeiro grau, e posteriormente o Tribunal, recusaram-se a analisar o conteúdo do vídeo. A justificativa? A indicação de links externos não constitui meio válido de prova no processo eletrônico trabalhista.

2. Por que o Juiz não aceita o Link Externo?

Você pode pensar que isso é excesso de formalismo, mas a fundamentação jurídica é sólida. O Tribunal baseou-se na Resolução CSJT nº 185/2017 e na Lei nº 11.419/2006.
O problema central é a segurança jurídica e a imutabilidade da prova. Um arquivo hospedado em uma nuvem privada (como o Google Drive da parte) está fora do domínio do Poder Judiciário.
Isso significa que a parte pode, a qualquer momento, alterar o vídeo, editá-lo ou simplesmente deletá-lo após a citação da outra parte. O Juiz não tem controle sobre a integridade daquele arquivo.
No acórdão que manteve a sentença, os Desembargadores foram claros: arquivos de áudio e vídeo devem ser anexados diretamente ao sistema PJe ou acautelados via sistema PJe-Mídias (escritório digital).
Ao usar um link externo, o advogado correu o risco da preclusão. E foi exatamente o que aconteceu. A prova foi desconsiderada, e como não havia outra prova robusta da manipulação dos venenos, o pedido de insalubridade foi julgado improcedente.

3. A Importância da Perícia Técnica e o Comparecimento do Cliente

Outro ponto crucial nesse processo foi a prova pericial. O juiz determinou a realização de perícia técnica no local de trabalho para verificar a insalubridade.
O Perito foi até a fazenda. O Reclamado estava lá, acompanhado de seus assistentes técnicos, porém, o reclamante não compareceu nem indicou assistente técnico.
A ausência do trabalhador na perícia é um erro fatal na maioria dos casos. Sem a presença do autor para contraditar a versão da empresa e apontar os locais exatos de trabalho, o perito fica restrito à versão patronal.
Neste caso, o dono da fazenda disse ao perito que o trator era cabinado, com ar-condicionado (o que neutraliza o agente químico) e que a mistura do veneno era feita exclusivamente pelo próprio dono, para evitar desperdício.
Sem o vídeo (que foi desconsiderado) e sem o trabalhador lá para demonstrar a realidade, o perito concluiu pela inexistência de insalubridade. Resultado: perda do adicional de grau máximo.

4. O Vínculo de Emprego: Onde a Defesa Falhou

Para não dizer que tudo foi perda para o trabalhador, o reconhecimento do vínculo de emprego foi mantido. E aqui vai uma dica para quem atua na defesa de produtores rurais.
A defesa tentou alegar que o trabalhador era "diarista" ou prestador de serviços eventuais. No entanto, ao depor, o preposto/reclamado admitiu que o obreiro trabalhava de segunda a sábado, cumpria horários fixos e recebia um valor mensal fixo.
Essa confissão real sepultou a tese de defesa. Na advocacia trabalhista, a primazia da realidade impera. Não adianta rotular como "diária" se existe habitualidade, subordinação e salário mensal. O juiz reconheceu o vínculo corretamente com base no depoimento pessoal das partes.

5. A Tentativa Tardia de Salvar a Prova

Após a sentença desfavorável quanto à insalubridade, o advogado do reclamante tentou, em sede de Recurso Ordinário, arguir cerceamento de defesa, pedindo a nulidade da sentença para que os vídeos fossem aceitos.
O Tribunal rejeitou a tese. O entendimento foi de que a parte teve todo o período de instrução para regularizar a juntada da mídia via sistema correto (PJe-Mídias), mas quedou-se inerte.
Deixar para alegar nulidade apenas no recurso, quando o vício poderia ter sido sanado na fase de instrução, atrai a preclusão. O processo não volta.

O Checklist da Prova Digital Segura

A análise deste processo nos deixa lições cristalinas sobre a atuação forense moderna. O direito material do cliente (a realidade de que ele manuseava veneno, por exemplo) pode perecer diante de uma falha processual técnica.
Para evitar que isso aconteça com seus processos, adote as seguintes práticas recomendadas:

1. Jamais confie em Links Externos

Nunca baseie sua prova principal apenas em um link de Google Drive, Dropbox ou OneDrive no corpo da petição. Os tribunais estão consolidando o entendimento de que isso não é prova válida.

2. Use o PJe-Mídias

Aprenda a utilizar o sistema oficial de acautelamento de mídias da Justiça do Trabalho. Se o arquivo for muito grande, fragmente-o ou converta-o para formatos mais leves, mas mantenha-o dentro do ecossistema da Justiça.

3. Prepare o Cliente para a Perícia

A perícia é o "segundo tempo" do jogo. O advogado deve garantir que o cliente compareça e, se possível, deve acompanhar a diligência pessoalmente ou enviar um assistente técnico. A ausência do autor é quase sempre sinônimo de laudo desfavorável.

4. Atenção à Preclusão

Se o juiz ignorou sua prova ou se houve falha na juntada, peticione imediatamente pedindo prazo para regularizar. Não espere a sentença para alegar cerceamento de defesa.

O advogado de sucesso não é apenas aquele que sabe o Direito Material, mas aquele que domina o caminho técnico para fazer esse direito chegar aos olhos do Julgador. Não deixe que um "link quebrado" quebre a sua causa.

Postar um comentário

Envie seu comentário (0)

Postagem Anterior Próxima Postagem
BAIXAR MODELO .DOCX
BAIXAR MODELO .DOCX