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Como Erros Procedimentais e Provas Digitais Definem o Sucesso na Justiça do Trabalho

provas digitais na justiça do trabalho


No dia a dia da advocacia trabalhista, deparamo-nos com situações que parecem, à primeira vista, simples disputas sobre verbas rescisórias. Contudo, a prática forense nos ensina que o diabo mora nos detalhes. Um caso recente, julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, ilustra perfeitamente como a tecnologia, se mal utilizada, pode ser fatal para a pretensão do cliente.

Neste artigo, analisaremos um processo envolvendo uma empregada doméstica e sua empregadora. O caso girava em torno de um pedido de rescisão indireta baseado em alegado assédio moral. No entanto, o desfecho da lide não foi decidido apenas pelos fatos narrados, mas sim pela forma como as provas foram — ou deixaram de ser — apresentadas ao juízo.
Veremos como a tentativa de juntar áudios via link externo resultou na exclusão da prova e como mensagens de WhatsApp foram decisivas para descaracterizar o assédio. 
A partir desse cenário, traçaremos um guia prático sobre o que fazer e, principalmente, o que evitar na instrução processual trabalhista.
Se você atua na área ou tem interesse no direito do trabalho, este texto servirá como um alerta sobre a importância do rigor técnico e da análise fria das provas digitais antes de ajuizar uma ação.

O Contexto da Disputa: Rescisão Indireta ou Pedido de Demissão?

A ação foi proposta por uma empregada doméstica que buscava a rescisão indireta do contrato de trabalho. A tese inicial era perseguição e humilhações após se recusar a trabalhar em um feriado e no aniversário do filho da patroa.
Segundo a narrativa da inicial, a empregadora teria proferido ofensas, chamando a atitude da trabalhadora de "ridícula" e "baixa", além de isolar os filhos do convívio com a empregada.
Diante desse suposto quadro de rigor excessivo e assédio moral, a trabalhadora pleiteou todas as verbas rescisórias como se tivesse sido demitida sem justa causa, além de indenização por danos morais.
Por outro lado, a defesa sustentou que a realidade era oposta. A tese defensiva foi a de que a trabalhadora, na verdade, desejava sair do emprego, mas não queria pedir demissão formalmente para não perder direitos. A defesa alegou que a ruptura se deu por iniciativa da obreira, configurando um pedido de demissão clássico, e que o suposto assédio jamais existiu.

O Erro Fatal: A Juntada de Mídias e o "Link" da Nuvem

Aqui reside a primeira e mais valiosa lição deste processo para os advogados: o procedimento técnico de juntada de provas. A advogada da autora tentou comprovar o assédio moral alegado através de áudios. No entanto, ao aditar a inicial, inseriu no corpo da petição um link para uma nuvem externa (OneDrive) onde os arquivos estavam hospedados.

Essa prática, embora pareça prática e moderna, é um erro processual grave no âmbito do PJe (Processo Judicial Eletrônico). A defesa, de forma astuta e tecnicamente correta, impugnou imediatamente essa forma de juntada. O argumento foi de que os áudios não respeitavam o procedimento exigido pelo Tribunal, que demanda o uso do "Acervo Eletrônico" do sistema PJe.
O juízo de primeira instância acolheu a impugnação da defesa. A sentença foi categórica ao desconsiderar o teor do link externo, fundamentando-se na Portaria GP/CR nº 09/2017 do TRT-2 e na Resolução nº 185 do CSJT. Tais normas exigem que arquivos de mídia sejam hospedados diretamente no sistema do tribunal para garantir a integridade, a perenidade e a segurança da prova.
Ao não observar a norma técnica, a autora perdeu sua principal — e talvez única — chance de tentar provar os gritos ou ofensas que alegou ouvir. O Tribunal Regional, ao julgar o Recurso Ordinário, manteve a decisão, reforçando que cabe à parte observar as normas técnicas de peticionamento eletrônico, não havendo que se falar em cerceamento de defesa quando a regra é clara e descumprida pela parte.

A Força das Mensagens de WhatsApp na Defesa

Enquanto a autora falhou na apresentação de seus áudios, a defesa brilhou no uso das mensagens de texto. A contestação trouxe transcrições e prints de conversas de WhatsApp que desmontaram a narrativa de "terror psicológico".
As conversas revelaram um tom amistoso entre as partes, incompatível com o assédio alegado. Mais importante ainda: a defesa juntou áudios transcritos onde a própria empregada admitia que "não estava dando conta" do serviço e perguntava se a patroa poderia dispensá-la.
Em um dos diálogos cruciais apresentados pela defesa, a empregadora explicou claramente: "Se você quiser ir... você faz uma carta de demissão... e arque com as consequências disso. A escolha é sua".
Isso provou que não houve coação para o pedido de demissão, mas sim uma recusa da empregadora em simular uma dispensa sem justa causa, o que é um direito do empregador e uma prática legalmente recomendada.
Além disso, mensagens posteriores mostraram a empregada pedindo desculpas por palavras ditas no calor do momento e a empregadora aceitando as desculpas, o que demonstrou uma tentativa de pacificação e não uma perseguição implacável.

O Dano Moral e a "Sensibilidade Exacerbada"

O pedido de dano moral foi julgado improcedente, e a fundamentação da sentença é uma aula sobre os limites do poder diretivo. A juíza sentenciante destacou que o assédio moral exige conduta reiterada e grave.
No caso, ficou provado que houve um desentendimento pontual sobre folgas e feriados, mas que isso foi resolvido com pedidos de desculpas mútuos. A magistrada pontuou que "não cabe o deferimento de indenização por danos morais pelo simples melindre, contrariedade ou mero dissabor".
A lição aqui é clara: conflitos existem em qualquer relação humana. Para que um conflito se torne um ilícito trabalhista indenizável, é necessário prova robusta de violação à dignidade, o que não ocorreu. A prova testemunhal ou documental (no caso, as mensagens) precisa corroborar a tese de humilhação, o que as mensagens carinhosas e os pedidos de desculpas juntados pela defesa afastaram completamente.

A Decisão Final: Improcedência e Pedido de Demissão

Sem a prova dos áudios da autora (excluídos por erro formal) e com a prova robusta das conversas de WhatsApp apresentada pela defesa, o juízo formou seu convencimento. Foi reconhecido que a iniciativa do rompimento partiu da trabalhadora.
A sentença declarou que a reclamante pediu demissão no dia em que deixou de comparecer ao serviço. Consequentemente, todos os pedidos de verbas típicas de dispensa imotivada (aviso prévio, multa de 40% do FGTS, seguro-desemprego) foram julgados improcedentes.
Como a empregadora já havia pago as verbas rescisórias devidas a um pedido de demissão dentro do prazo legal, não houve condenação em multas dos artigos 467 e 477 da CLT. A ação foi julgada totalmente improcedente.

Conclusão

A análise deste processo nos oferece um roteiro seguro para a atuação advocatícia de excelência. O sucesso da defesa e o insucesso da autora não decorreram apenas da verdade dos fatos, mas da técnica processual aplicada.
Para o advogado que atua pelo reclamante, fica a lição vital: jamais confie em links externos para juntada de provas. O PJe possui ferramentas específicas para o acervo digital. Ignorar a Portaria do Tribunal é assumir o risco de ver a prova ser desconsiderada, condenando a ação ao fracasso. Além disso, é crucial auditar as provas do cliente. Se o cliente diz que sofreu assédio, mas as mensagens de WhatsApp mostram uma relação cordial e pedidos de demissão, é dever do advogado alinhar as expectativas e avaliar o risco da demanda.
Para o advogado de defesa, o caso reforça a importância da preservação da prova digital. O arquivamento de conversas de WhatsApp, áudios e a transcrição fiel desses diálogos são munição pesada contra alegações infundadas de rescisão indireta. A contestação bem instruída com a realidade fática das conversas desmantelou a narrativa de vitimização.
Em suma, o processo vence-se na instrução e na forma. Conhecer a tecnologia do processo eletrônico é tão importante quanto conhecer o Direito Material. Evite atalhos procedimentais e instrua seu cliente a documentar a relação de trabalho; esses são os pilares de uma advocacia preventiva e contenciosa de sucesso.

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